segunda-feira, 31 de agosto de 2009

Querido,

Não penses que ele (o Mundo) não me verás caso eu me esconda na multidão.
Não é me escondendo que quero ser vista.
Prefiro um pouco de exposição - ainda que sinta medo-
para que eu possa tentar melhorar.
Entendo tua precaução. Mas ela é tua.
Está em ti esta prudência de não te mostrar.
Não digo, contudo, que estás errado.
Mas também não me sinto equivocada quando faço o exato oposto do que me pedes..

Agradeço-te a preocupação,
mas quero que ele(o Mundo) me veja tal como sou.
E por isso sigo a tentar exibir minhas prendas.
Porque de nossas percepções há dois caminhos - O Mostrar ou o Esconder.
E lá vou eu, pai,
pulando da pedra alta,
expondo-me aos riscos.
Quando olho da janela
Inúmeras ruas e carros e pessoas,
No meio de tudo isso vejo o futuro chegar.
Choro um pouco porque sinto medo.
O que tenho eu para apresentar-lhe?
O que posso eu mostrar ao meu futuro?!

Não há genialidade. Nem grandes talentos.
Há alguns sonhos e expectativas. Muitos planos.
Porém são inúmeras as incertezas e inseguranças.
As metas não possuem rotas muito claras
e alguns caminhos que traço parecem dissolver-se no vento.

Diante de tudo isso como posso eu não temer o Futuro?
Não há facilidades ou eternas felicidades.
Meu estado de alegria não é estático.
Penso em momentos felizes
E percebo que estar feliz sempre parece mais longevo quando pensamos essa alegria no passado.]
Como se no presente ela fosse mais curta:
Um sorriso. Um suspiro.

E sigo a pensar no Futuro que vem surgindo na minha janela
tantas outras cousas me vêem à mente,
e todas elas apontam para o meu despreparo.
Minha falta de iniciativas, de talentos e genialidade.
Torno a chorar.
De raiva por não deixar de assumir minhas falhas,
Por saber que ainda sendo mais fácil forjar pseudo-talentos
mostro-me assim, a inspirar-me num espelho.
Também há um certo ressentimento,
um despeito, porque comigo as cousas não costumam ser fáceis..
(mas isso é outra história, outro caso e outro poema!)

Então, lembra-te, Futuro, que mesmo assim estou da minha janela, a te esperar.

sábado, 22 de agosto de 2009

Primeira confissão de Ester

Eram sete e meia da manhã. Acordei com o gotejar da chuva que caía já há algum tempo. Levantei e fui ao banheiro. Deitei-me novamente. Era mais uma manhã. Não, não era. Voltei para a cama e não dormi. Eis aí o prefácio da singularidade desse dia: não vindo o sono, resolvi levantar. Mas naquele instante me pareceu não haver absolutamente nada para fazer, exceto pensar. E foi o que fiz. Incrivelmente meus pensamentos não descambaram para crises fatídicas ou tragédias gregas. Não queria sofrer com lembranças desagradáveis; nem queria ceder aos apelos do mundo. Poderia deixar para outra hora os problemas da humanidade.
...
As cortinas das minhas idéias se fecharam; e quando se abriram novamente uma apresentação se iniciava: era um pouco de música e teatro. Havia interpretação e ritmo na dança e na canção. A chuva caía como cascata e ventava muito na rua, árvores da calçada eram um grupo de ninfas a dançar languidamente a canção sussurrada pelo vento. Eis um espetáculo: jovens moças dançando, a celebrar a vida. A chuva era o roteiro, que na sua mudez, tocava. As árvores-ninfas, as dançarinas, a minha rua, o cenário, o vento realizava a trilha sonora. E eu? Era o público; deliciada, ria da minha ingenuidade, da minha imaginação de criança.
...
Ingenuidade sim. Poderia ter ligado a televisão ou o rádio, poderia ter lido um livro. Em vez disso, brinquei. Usei a imaginação como costumava fazer quando criança - gostava de olhar as estrelas e conversar com elas, como se eu fosse uma estrela também.
...
Nessa minha brincadeira o sono voltou. Meus pés ainda doíam dos sapatos que tanto me cansaram na gafieira. Quando deitei-me na cama compreendi o que diferenciou aquela manhã de tantas outras: não haviam mais máscaras, e eu voltara a ser doce menina de novo. Parecia não haver motivos para mais fugas e jogos de amor. Por volta das oito me encontrava sonolenta, cansada da inocente brincadeira. Meu corpo estava leve e relaxado,como costumava ser anos atrás e eu me sentia ligeiramente feliz... Amanhã tiraria meu luto.

Da minha entrega,

Areia úmida, meus pés sentem frio. A manhã ainda é jovem.
Num ambiente poético que é o mar numa manhã que se inicia resolvo me entregar.
Vagarosamente caminho na direção dele,
quanto mais me aproximo, sinto que acelero os passos - quero logo chegar.
Já sinto a água bem fria tocar meus pés. Arrepio-me.
Um pouco de frio e de medo também. Medo da felicidade, da beleza de tudo isso.

Na tua direção vou, como a caminhar de encontro ao mar.
Meio desajeitada, atiro-me ao leito d'água, como se dele quisesse fazer parte.Como de ti quero também.]
Das tuas correntezas e de tuas ressacas. Eu te desejo por completo.
Dos teus receios e dissabores, pois posso chorar contigo o quanto quiseres.

Mas posso rir e ser agradável.
Cantar em teu ouvido o prazer da tua presença.
("é que no peito do desafinado também bate um coração.")

E posso ser teu exclusivo prazer. E quero.
Te dar minha carne, meu corpo...

Finalmente entrego-me por inteiro.
Ofereço-te meu corpo, minhas carícias e meu coração.
Porque o que mais almejo agora é ser teu abrigo, tua ponte, tua mulher.

Pedido

Este soneto deve ser lido como um pedido:
Eu te peço amor e cumplicidade.
Quero um pouco de paciência também,
e a lealdade e fidelidade que pretendo te dar.

Eu quero teus olhos para me encontrares quando eu estiver perdida.
Teus lábios para nossos beijos doces,
E também para me aconselhares quando eu precisar.
Quero você comigo e que eu esteja contigo também,e que seja assim por todo o tempo.

Esses suspiros, os quero para sempre.
Envolve-me em teus braços fortes,
pois assim me sinto amada e segura.

Surpresas, boas-novas e histórias.
Não mais só,
Quero andar de mãos dadas contigo.

terça-feira, 11 de agosto de 2009

O segundo conto de Ester

Ao chegar à sua casa, Ester sentiu que a vida continuava. Não adiantava perder-se no redemoinho de seus sentimentos, uma vez que o mundo prosseguiria com sua misteriosa harmonia. E afinal, era terça-feira e seus dias de terça-feira costumavam ser animados: após sua corrida diária, tinha horário com Rose, sua manicure e cabeleireira improvisada. Rose na verdade era sua vizinha, que acorrentada a um matrimônio autoritário, deliciava-se ao enfeitar sua amiga para momentos felizes que ela mesma já não podia mais ter.
Terminada a corrida, Ester tomava um longo banho; fechava os olhos e deixava a água percorrer todo o seu corpo- imaginava-se numa bela cachoeira, a banhar-se nua e livre. Já enrolada na toalha, ia enxugando-se lentamente quando o telefone tocou; era Rose com a voz ainda chorosa. Seu marido havia bebido e ela não poderia ajudar sua amiga a se arrumar:
- Você sabe como ele é. Vai dizer que estou indo encontrar outro.
Ester consolou a amiga, afinal de que adiantaria tentar acordá-la daquele pesadelo? Para quê lembrar-lhe que aquela vida era tão pouco? Por que fazer Rose se deparar com verdades tão cruéis ? Rose ainda não estava verdadeiramente disposta a mudar. Ester se indagava tais coisas enquanto dizia quase que mecanicamente à amiga:
- Calma, Rose. É só um mau dia. Faz a janta...quem sabe ele não dorme?
Encerrou a ligação com um "eu te amo" que demonstrava a cumplicidade daquela amizade. Ester estaria ali para tudo e para sempre. Ainda absorta nos problemas de sua amiga, ela corre para atender o telefone, que toca insistentemente. São outras amigas, as companheiras da gafieira:
- Sim, eu vou. Termino de me arrumar em uma hora. Até mais. Beijo.
E Ester voltou ao seu quarto. Ia vestir a roupa que já estava separada. Lingerie e saia novas para mais um novo começo. Depois sentou-se de frente para a penteadeira, soltando a toalha que prendia seus cabelos ainda úmidos. Começou a secá-los, mas como achou tudo quieto demais, ligou o rádio e ao sussurar algumas canções havia secado todo o cabelo. Mas ainda achou seu cabelo muito volumoso- não possuía o talento de sua Rose- e por isso prendeu-o num coque.
Agora, restava apenas a maquiagem. Era sua parte favorita. Seu momento de arte. Sentia-se mais mulher quando espanava o pó rosado paralelamente aos olhos, nas maçãs de seu rosto. E riscou um lápis bem preto nos olhos, junto com um rímel que esticava-lhe os cílios. Ester gostava de olhar seus grandes olhos destacados na pintura que fazia de si mesma: eles eram o instrumento de sua curiosidade, seu espírito observador e de sua sensualidade também...
Passou-se aquela hora. E foi com um prazer imenso que Ester calçou os sapatos e virou-se novamente para o espelho. Aquela dor havia passado, sentia-se uma bela mulher novamente.

domingo, 9 de agosto de 2009

do teu ódio,

Se o humano se deslumbra com o que aprendeu sobre o mundo,
as miudezas lhe afetam profundamente a vida. É o seu ego.
Mas só isso não atesta fraqueza.
O ser fraco é aquele que se julga deveras forte diante das cousas pequenas.
Ele não consegue admitir superioridade alheia.


Fraquezas, todos talvez as possuamos
mas o fraco vai além das fraquezas,
pois diz respeito a uma grande fraqueza em particular: a pretensão do saber tudo,
do viver tudo( terá ele conquistado tudo também?!)

O fraco é o escárnio,
é quem se julga dono do absoluto
- da verdade, da razão e de outros pormenores.
Ora, ele não é!
O coitado lameou-se numa farsa.

Ester, neste momento, não te apiedes destes fracos
E sorri, pensando nas imensas dores que sofrem
- como aquelas, que causam em ti.
Te vingues dos fracos nas tuas palavras odiosas e assim expurga este rancor que vai em teu peito .
Que de tuas palavras saiam faíscas,
que elas queimem feito magma incandescente,
tal é o ódio que de passagem assola- te os pensamentos.
Lava o teu corpo deste imundo ódio,
E retoma o teu caminho de paz.